Como estava combinado, meu post de 18 do corrente, Trovoadas – Um dos mais dramáticos fenómenos
meteorológicos, cambamos e partimos para o segundo bordo, como proteger a
embarcação e a tripulação.
Os efeitos de um
raio.
Para o homem os efeitos da queda de um raio são queimaduras
graves com destruição de tecidos e/ou paragem respiratória e/ou paragem
cardíaca e muito provavelmente a morte.
A bordo a tripulação pode saber quando está eminente a queda
de um raio, uma vez que no momento em que a embarcação atravessa uma zona carga
positiva, pode-se observar, se for de noite, uma luminescência no céu, ouve-se
um zumbido semelhante ao produzido pelas abelhas e um forte odor característico
no ar. Quando o raio está eminente, ouve-se um assobio estridente.
Sob pena de morrer, os tripulantes devem afastar-se do
mastro o mais possível e colocarem-se de cócoras, com os pés juntos, as mãos
atrás da cabeça apoiada nos joelhos.
O mais aconselhável é permanecer no interior da embarcação
durante o tempo que durar a trovoada, limitando ao mínimo indispensável a
exposição da tripulação à intempérie..
Para o veleiro os efeitos da queda de um raio são:
- o casco estala numa forma radial a partir da quilha,
quando a base do mastro pousa sobre o quilha;
- incendio do veleiro, quando a base do mastro pousa sobre a
coberta, ficando isolado do mar;
- perfuração do casco, fusão de algumas peças metálicas;
- destruição total da electrónica de bordo e descalibração
das bússolas.
Partindo da lâmpada do topo do mastro, do anemómetro, da giroutte
ou da antena da VHF (figura abaixo) o raio passa sempre pelos cabos dos
circuitos eléctricos ou electrónicos, incendiando tudo á sua passagem até ao
mar.
Mastro sem estar ligado a uma placa de massa
Mastro ligado a uma placa de massa.
Avaliação do risco de
apanhar com um raio.
Este risco depende a época do ano em que nos encontramos
(mais o menos favorável á circulação de massas de ar instáveis, logo maior
probabilidade de ocorrer trovadas) e do indicie ceráunico (indicie que indica o
número de dias de trovoada por ano numa determinada região) da zona onde
navegamos.
O risco de levar com um raio é potenciado para o objecto que
assegure o melhor contacto com o mar: é no topo deste objecto que são
acumuladas as cargas positivas. No caso do veleiro, como vimos, será sempre o
topo do mastro.
Geralmente o mastro de um veleiro é 1,5 a linha de água do
veleiro. Se a presença do mastro explica a razão pela qual aumenta a
possibilidade de atrair um raio, a sua altura permite estimar o risco disso
acontecer.
Supondo que um veleiro com uma linha de água de 10 m, terá
um topo de mastro a 15 m acima do mar. O mastro vai atrair o raio numa
superfície circular da qual o raio (este da circunferência) é igual a duas
vezes a sua altura. No nosso exemplo, (15 x 2)2 x 3,14 = 2.800 m2.
Assim, o risco de o raio nas cair em cima numa área de 1 km2
será de:
1.000.000 m2 / 2.800 m2 = 350
(aproximadamente)
Quer isto dizer 1 para 350 raios por km2.
Se tivermos conhecimento da frequência de raios por km2
da zona onde navegamos, por exemplo 7
por ano, o nosso risco pode ser avaliado de uma vez todos os (350/7) 50 anos.
Na regiões tropicais e equatoriais, onde o indicies
ceráunico são sempre muito elevados (pelo menos uma centena de trovoadas por
ano), o número de raios por km2 é de várias dezenas.
Na verdade quando navegamos ao largo, o risco de ser
apanhado por um raio é baixo, não quer dizer nulo. Na verdade, no mar alto, o
que se passa é que as cristas das vagas fazem melhor um efeito poder das pontas que o nosso veleiro. Podemos ter sempre o
azar da descarga eléctrica no momento em que o barco passa a crista da onda....
Quando estamos fundeados, os riscos são importantes. De uma
forma geral é em final de tarde que as trovoadas surgem quando a embarcação já
se encontra fundeada. Á semelhança de uma árvore dominante numa planície, o
mastro de um veleiro em águas calmas pode potenciar o efeito poder das pontas.
O que fazer para se
proteger dos raios?
Para que não haja riscos nenhuns é necessário que o mastro e
seus componentes se encontrem ligado electricamente ao casco, ele próprio
condutor. Este é o caso dos veleiros cujo os cascos são em alumínio ou em aço
em que a tripulação não arrisca nada no seu interior, desde que não toquem em
nenhum dos componentes metálicos. Não há registo nos veleiros de construção
metálica de vitimas ou de avarias maiores, mesmo sendo este tipo de construção,
metálica, mais propicia a atrair os raios. A significativa quantidade de metal
em contacto com a água, favorece a rápida dissipação da carga eléctrica.
Para estar seguro durante uma trovoada num veleiro em fibra
ou outro material não metálico, não existe outra solução que a montagem de um
sistema pára-raios, permitindo a captação, condução e descarga do raio.
Este dispositivo é constituído por:
- para a captação, uma vareta de cobre (ponteira), cuja a
extremidade ultrapasse em 20 cm a ponta do mastro;
- para a condução, uma tira condutora, com condução idêntica
á de um cabo de cobre com 20 mm2 de secção mínima;
- para a descarga, uma placa de massa de cobre com o mínimo
de 0,2 m2 de área, com uma espessura de 4 mm, fixada em local e
posição que mantenha o contacto permanente com a água, sob quaisquer condições
de navegação.
Este dispositivo pára-raios não vai impedir que o veleiro
seja atingido pelo raio, mas pelo contrário, o risco é potenciado. O objectivo
do dispositivo é proteger a tripulação e a embarcação.
No exterior da embarcação:
Veleiro em piloto
automático
Com ou sem pára-raios, é sempre mortal segurar no leme!
A solução usada por alguns tripulantes de arrastar na água
correntes presas aos brandais não vale de nada, uma vez que a superfície de contacto
eléctrico entre a corrente e os brandais, bem como entre os elos das própria
corrente, é de apenas de alguns milímetros quadrados. Conseguimos potenciar a
probabilidade de ser atingidos por um raio, sem garantir que conseguimos
dissipar a energia deste.
A antena VHF e o seu cabo, não podem, em caso algum,
funcionar como pára-raios. Pelo contrário se o raio os atingir, teremos que
temer o pior. O cabo da antena deve estar sempre resguardado de uma proteção
trifásica que se encarregue de conduzir para o mar toda a eléctricidade da
descarga, antes desta chegar ao emissor/receptor, o que pressupõe uma placa de
massa instalada.
Sem um pára-raios instalado que permita a condução e
respectiva descarga, poderemos usar um tubo condutor com um mínimo de 7 cm2.
É o caso do tubo do mastro que de uma forma geral é fabricado em materiais
muito condutores, constituindo assim um excelente canal para a condução do
raio. Resta-nos assim estabelecer a ligação do mastro com a superfície que se
encontra em contacto com a água para permitir a descarga. Para isto podemos
usar cabo especifico, 3 condutores de cobre entrançados com uma secção mínima
de 8 mm2. Este cabo deve ser enrolado no pé do mastro e ter o
comprimento suficiente para chegar até cerca de um metro de profundidade, onde
na sua extremidade será soldada uma placa de cobre com pelo menos 30 cm que
ficará submersa. Este dispositivo deve apenas ser montado quando a trovoada
está eminente (sob pena de fenómenos electrolitícos que podem deteriorar o
mastro nunca devemos deixar esta instalação montada em permanência).
Há que ter muita atenção quando a descarga é conduzida pelo
mastro, pois poderá haver arcos eléctricos entre o mastro e todas as peças
metálicas que se encontrem num raio de 2 m, quer dizer brandais, estais,
varandim, correntes, etc.
Por esta razão de preferência ter o mastro ligado a uma
placa de massa, ou na pior das hipóteses a um dos parafusos do patilhão (ver
fotos abaixo) deforma a evitar o efeito de arco eléctrico.
Como está no desenho acima (no exterior da embarcação),
devemos ter uma rede que ligue todas as componentes metálicas á placa de massa.
É imperativo manter-se afastado desta rede durante uma
trovoada.
As baterias devem ser deligadas nos bornes, os equipamentos
electrónicos desligados por completo. O manuseamento de qualquer equipamento
electrónico, mesmo o VHF, é fortemente desaconselhado.
A antena VHF deve ser desenroscada. Ter em atenção em
proteger esta ponta, pois no caso de receber uma descarga, pode se dar o efeito
de arco a partir da dita ponta (raio de 2 m).
Mesmo que esteja muito calor, manter todas as janelas e
aberturas fechadas.
O tripulante(s) que estiver de quarto, deverá estar de botas
de borrachas sentado no poço (na madeira ou fibra) e o mais afastado possível
de todas as componentes metálicas. Procurar nunca se colocar entre o mastro e
qualquer componente metálica, nomeadamente na linha entre o mastro e o motor.
Não deverá deitar-se, nem manter as pernas afastadas.
O veleiro deve navegar (até onde for possível) em piloto
automático.
Se estiver fundeado, não condene á morte um tripulante
dando-lhe instrução para manipular o ferro!
Nunca tomar banho nas proximidades do veleiro.
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